No Dia Mundial de Luta Contra as Hepatites Virais, médico do HCC esclarece sobre o tema
O médico gastroenterologista do corpo clínico do HCC, Dr. Wernher Schwambach, é responsável pelo Serviço de Assistência Especializada – SAE, da Secretaria Municipal de Saúde, cujo objetivo é atender pessoas portadoras de doenças infeccionas, entre elas, a Hepatite.
Em 28 de julho, comemora-se o Dia Mundial de Luta Contra as Hepatites Virais. A data, instituída pela Organização Mundial de Saúde (OMS), visa atrair a atenção da sociedade para o tema, incentivando a criação de políticas públicas eficientes, que garantam o acesso universal ao tratamento e prevenção da doença.
Para esclarecer sobre o tema, o Hospital de Caridade de Carazinho apresenta uma entrevista com o médico gastroenterologista de seu Corpo Clínico, Dr. Wernher Schwambach, que é responsável pelo Serviço de Assistência Especializada – SAE, da Secretaria Municipal de Saúde, cujo objetivo é atender pessoas portadoras de doenças infeccionas, entre elas, a Hepatite.
P: Em termos gerais, que é a Hepatite?
Dr. Wernher: O termo Hepatite vem de “hépatos”, que significa fígado, em grego, e o sufixo “ite” é inflamação. Então, Hepatite significa inflamação do fígado. Essa inflamação do fígado pode ter várias origens, ou seja, pode ser causada por uma substância química, medicamentosa ou não, por substâncias tóxicas, inclusive de alimentos, e tem um grande grupo que são as Hepatites Virais, causadas por vírus.
No caso das causadas por substâncias químicas, vale a pena citar um grande problema que é o álcool, cujo consumo provoca agressão ao fígado. E há, também, o que chamamos de Esteato-hepatite não alcoólica, que consiste em uma agressão ao fígado ocasionada por um problema no metabolismo dos carboidratos. Assim, mesmo não bebendo álcool, se não cuidar a alimentação, a pessoa poderá ter uma evolução da doença hepática parecida com a evolução da doença do álcool, ou seja, vai evoluir para cirrose, sem beber álcool.
P: O foco da campanha, porém, são as Hepatites Virais. O que é importante destacar sobre elas?
Dr. Wernher: Nesse grupo das Hepatites Virais, então, existem dois subgrupos, as Hepatotróficas e as Não-hepatotróficas.
As Hepatites Não-hepatotróficas, são oriundas de vírus que provocam outras doenças no ser humano e, associado a isso, ocasionam um processo inflamatório no fígado, o qual, geralmente, não é a parte mais evidente da doença. Para citar como exemplo, existe uma síndrome chamada Mononucleose Infecciosa, que é produzida por vários vírus diferentes e provoca alteração das enzimas hepáticas também.
Mas, o que devemos destacar mesmo, são as Hepatites Hepatotróficas, que são causadas por vírus cujo foco é realmente atacar o fígado. E essas Hepatites são conhecidas pelas letras A, B, C, D e E, além de outras menos importantes.
P: Qual a diferença entre as Hepatites?
Dr. Wernher: A Hepatite A e a Hepatite E são causadas por vírus que tem transmissão fecal-oral, ou seja, a pessoa doente elimina o vírus pelas fezes, essas fezes contaminam os alimentos e a água e, assim, produzem outros casos de Hepatite. Em países que não possuem um sistema de saneamento adequado, geralmente, a água é contaminada. E essa água contaminada pode ser usada tanto para beber como para irrigar ou lavar alimentos que são consumidos crus.
A Hepatite A é bastante rara aqui no Rio Grande do Sul, principalmente na região norte. Isso, porém, faz com que as pessoas não tenham mais tanto contato com esse vírus na infância, o que é um fator negativo, porque a doença é muito mais grave na pessoa adulta. Então, recomenda-se que as pessoas que não tenham anticorpos para a Hepatite A façam a vacina, principalmente se forem viajar para países onde ela é mais frequente. É uma vacina que está disponível há pouco tempo, por isso, a maioria das pessoas adultas não é vacinada. Hoje, as crianças de até dois anos recebem a vacina universal obrigatória.
A Hepatite E é parecida com a A. Ela também é um vírus de transmissão fecal-oral. Não existem casos autóctones de Hepatite E aqui do Brasil. Nas Américas, temos casos registrados no México e na Venezuela. Então, é algo que um dia pode ocorrer aqui. Um detalhe importante sobre a Hepatite E: ela é muito grave em gestantes, geralmente provoca aborto.
P: Então, a preocupação principal é com os tipos B e C?
Dr. Wernher: Sim. A Hepatite B predomina em algumas regiões do mundo. No Brasil, a doença existe mais na região norte, porém, aqui no sul, há uma zona de alta prevalência que abrange o oeste de Santa Catarina, uma faixa norte do Rio Grande do Sul e o sudoeste do Paraná.
A Hepatite B é muito fácil de ser transmitida. A transmissão, tecnicamente, ocorre por contato com o sangue ou secreções de pessoas que têm o vírus. Ou seja, ela é transmitida por meio de alicates de cutícula, lâminas de barbear, pela relação sexual desprotegida, no fazer tatuagens e em procedimentos com materiais cuja esterilização não é segura, por exemplo. Hoje, com a vacinação universal, a tendência é que a Hepatite B diminua cada vez mais.
A transmissão da Hepatite C também ocorre de forma parenteral, ou seja, através do uso de material contaminado ao fazer tatuagens, uso de drogas injetáveis e assim por diante. Por ter uma carga viral mais baixa, é mais difícil contaminar-se com o vírus da doença por transmissão vertical, que é da mãe para o filho na hora do nascimento, e por relação sexual.
Tem um último tipo de Hepatite, ainda, que é a D, ou Delta. Consiste em um vírus defectivo que sozinho não provoca Hepatite. Ele só provoca Hepatite junto com o vírus da Hepatite B, ou seja, na verdade, ele piora a Hepatite B. Uma pessoa que já tem a B pode pegar a D ou, então, contrair as duas mesmo tempo. Por isso, é importante ressaltar que se você está vacinado para a B, não irá contrair a D.
Eu não tenho conhecimento de nenhum caso de Hepatite D aqui na nossa região, mas não é impossível que apareça, porque esse vírus ocorre no estado do Amazonas, mais próximo da fronteira com o Peru. Essa é a região de risco. Então, como há pessoas que transitam nesse espaço, é possível que um dia a doença comece a chegar aqui.
P: Como é o tratamento das Hepatites B e C?
Dr. Wernher: As Hepatites B e C são doenças que podem tornar-se crônicas. No caso da Hepatite B, de cada 100 pacientes que se contaminam com o vírus, cinco terão algum problema de cronificação e, assim, precisarão fazer o controle e, eventualmente, serão submetidos a tratamento.
O tratamento da Hepatite B não é curativo, ou seja, ele controla o vírus, mas não termina com a doença. A doença pode desaparecer espontaneamente e o tratamento ser suspenso, porém, isso acontece eventualmente. Na maioria dos casos, o tratamento da Hepatite B é para sempre.
É importante ressaltar que a Hepatite B tem uma vacina muito eficaz, então, hoje as crianças recém-nascidas recebem a vacina já no hospital e isso é algo extremante eficiente. As gestantes devem ser investigadas para Hepatite B e, no caso de gestantes portadoras da Hepatite B crônica, os bebês, quando nascem, recebem a vacina e a imunoglobulina hiperimune, e isso faz com que a chance de transmissão seja extremamente baixa.
Com relação à Hepatite C, apesar de ser mais difícil de ser transmitida, o seu índice de cronificacação é de 80%. Ou seja, de cada 10 pacientes contaminados, oito terão a doença e, provavelmente, terão que ser submetidos a algum tipo de tratamento. Os protocolos de tratamento da Hepatite C mudaram recentemente, então, agora, pela primeira vez, nós temos o tratamento universal. Todo o paciente portador de Hepatite C, independentemente do grau de fibrose, recebem o tratamento.
A má notícia é que não existe vacina para a Hepatite C. A boa notícia é que a doença é muito mais controlável, do ponto de vista de transmissão, e muito melhor tratável. A Hepatite C é curável, com um índice de cura acima de 90%, chegando, em alguns genótipos, a 97%.
P: A Hepatite apresenta sintomas?
Dr. Wernher: Existe a Hepatite Aguda, que pode causar sintomas mais ou menos intensos, como febre, mal estar geral, dores no corpo e articulações, além da icterícia (amarelão) e colúria (urina amarelada). Qualquer um dos tipos de Hepatite pode ocasionar esse quadro clínico, no primeiro contato com o vírus.
No caso da Hepatite A, depois de curada, a pessoa fica imune à doença. No caso da Hepatite B e C, a fase aguda pode ser tão fraca que a pessoa nem percebe que teve, então, o vírus fica dentro do corpo atuando sobre o fígado. Quando a pessoa começar a sentir algo, ela terá sintomas de cirrose. E isso pode demorar anos.
Então, geralmente, as Hepatites crônicas não causam sintomas. Mas, raramente, podem apresentar sintomas de doenças dermatológicas ou reumáticas.
P: Então, o diagnóstico é somente com exames?
Dr. Wernher: Sim, somente com exames. E para isso existe a chamada testagem voluntária, realizada no SAE - Serviço de Assistência Especializada, junto à Secretaria Municipal de Saúde. Ou seja, qualquer pessoa pode procurar o serviço, voluntariamente, e fazer os testes. O atendimento é realizado por enfermeiras, registradas no COREN, que têm obrigação de manter o sigilo das informações.
P: Se o resultado do teste for positivo, qual o procedimento?
Dr. Wernher: Se houver positividade do teste rápido, a pessoa é acolhida pela equipe do SAE - composta por médico, psicólogos, enfermeiros -, é informada sobre a doença, sobre os tratamentos disponíveis, os efeitos adversos da medicação. Mas, obviamente, nada é obrigatório, ou seja, a pessoa participa da decisão de tratamento.
P: A Hepatite pode evoluir para algo mais grave?
Dr. Wernher: Sim, esse é ponto, por que a gente trata as Hepatites? As Hepatites podem evoluir para cirrose ou câncer no fígado, o Hepatocarcinoma, que é o carcinoma originário do fígado. Isso tanto a B quando a C. Nesse caso, a B tem um detalhe, o próprio vírus é carciongênio, então, a pessoa não precisa ter cirrose para ter câncer. Já na Hepatite C, ela vai evoluir para cirrose e, em decorrência disso, pode vir a ter câncer no fígado também.
P: De modo geral, quais são os principais cuidados para a prevenção das Hepatites Virais?
Dr. Wernher: No caso das Hepatites de transmissão fecal-oral, basicamente, é o consumo de água e alimentos de origem reconhecida. De qualquer forma, aqui na nossa região, é muito difícil encontrar casos de Hepatite A e E.
A Hepatite B e a C são transmitidas, no caso da B, principalmente, por relação sexual desprotegida, então, o uso da camisinha é importante, e no fazer tatuagens, por isso, deve-se optar sempre por estabelecimentos que utilizem materiais descartáveis, tanto as agulhas quantos os frascos de tinta. Além disso, é importante evitar fazer injeções e procedimentos cirúrgicos ou estéticos com materiais cuja esterilização não é segura.
Muito importante, também, é vacinar-se contra as Hepatites A e B e fazer o teste rápido que identifica a doença, que é gratuito e voluntário.
P: Para os profissionais de saúde, há cuidados especiais?
Dr. Wernher: O profissional de saúde tem uma situação especial, que é o acidente de trabalho. Assim como, por exemplo, o trabalhador de construção civil tem risco de queda de altura, nós, profissionais de saúde, estamos sujeitos ao acidente de punção – que é quando o profissional se pica, acidentalmente, com a agulha utilizada no paciente e é contaminado.
Nós temos medicamentos para tratar esses casos, mas, é essencial que todo o profissional de saúde seja vacinado.
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